A cúpula do clima da ONU, a COP 19, conseguiu esboçar neste sábado um compromisso de última hora para elaborar medidas que levem a um novo acordo contra o aquecimento global.
Ainda que modesto, o compromisso foi comemorado pelos participantes, após as negociações terem estado à beira do fracasso e terem avançado um dia além do previsto - por conta de divergências entre países ricos e países em desenvolvimento a respeito de suas respectivas responsabilidades quanto à redução de emissão de gases do efeito estufa.
Mais de 190 países concordaram em elaborar "contribuições" (já que a palavra "compromissos" foi rejeitada) para o novo acordo, que só deve ser concluído em 2015 para vigorar em 2020.
Após Índia e China terem argumentado que países em desenvolvimento não devem ter as mesmas obrigações que os desenvolvidos em conter emissões - o que levou ao principal impasse das negociações -, chegou-se a um acordo de que todos devem agir para conter as emissões, informa a agência Reuters.
Críticas
Nem os ambientalistas e os diplomatas mais entusiasmados esperavam grandes avanços das negociações da COP 19, em Varsóvia, na Polônia.
Mas as cenas vistas nos últimos dias do evento deram a medida dos pontos de fracasso nas negociações, que pretendiam chegar a alguns acordos para reduzir o aquecimento global e mitigar seus efeitos.
Primeiro, choveram críticas ao país sede, que decidiu abrigar concomitantemente à COP uma convenção sobre carvão, um dos combustíveis mais poluentes do planeta. Em seguida, o governo demitiu o ministro de Meio Ambiente da Polônia, Marcin Korolec, que também era o presidente da cúpula, enfraquecendo seu poder de liderança.
Outra cena que marcou a conferência ocorreu na quinta-feira, quando todas as grandes ONGs ambientais e sociais abandonaram o evento por estarem frustradas com o andamento das negociões. Milhares de ambientalistas foram vistos devolvendo seus crachás e deixando o local da COP.
"No geral, os resultados dessa COP ficaram muito aquém das expectativas, que já eram baixíssimas", disse à BBC Brasil Bruno Toledo, membro do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (FGV), que foi a Varsóvia acompanhar a cúpula.
"Os avanços foram muito marginais e vimos até alguns retrocessos no processo de negociação que pretendia pavimentar o caminho para a COP de Paris (2015)."
A meta das últimas cúpulas da ONU é alcançar, daqui a dois anos na França, um novo entendimento global a fim de substituir o Protocolo de Kyoto - o acordo internacional que restringe as emissões caus
as do efeito estufa e que expira em 2020.
Vilões
Para Toledo, os principais vilões foram a própria Polônia, por sua falta de liderança, além de Canadá, Japão e Austrália, que reduziram ou estagnaram suas metas de emissões de gases-estufa. Ele afirmou ainda que o posicionamento retraído de alguns países e blocos, como EUA e União Europeia, também atravancaram a discussão.
Já o secretário de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente do Brasil, Carlos Klink, diz que deixa Varsóvia preferindo ver o copo meio cheio.
"É claro que algumas questões não avançaram, especialmente na questão do financiamento. Ficamos chateados com a falta de ambição nas metas de alguns países desenvolvidos, que certamente precisam comparecer mais", disse.
"Também ficamos chocados com o fato de nem ter entrado em pauta a proposta brasileira de calcularmos as emissões históricas dos países. Mas alguns itens da nossa proposta foram contemplados, especialmente o mecanismo de Redd+ (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal)."
Para o Brasil isso é importante porque tem relação direta com as florestas. O Redd cria regras internacionais para que as nações desenvolvidas financiem projetos em países em desenvolvimento (e que ainda tenham florestas), para reduzir o desmatamento e, consequentemente, as emissões de gases que são liberados quando há perda de área verde.
"Sem aplausos"
Mas para o diretor de políticas públicas do Greenpeace Brasil, Sergio Leitão, nem mesmo a questão do Redd deve ser motivo para celebração.
"É difícil isolar um assunto quando todo mundo se saiu mal. Quando a sociedade inteira perde, nenhum país merece aplauso", disse.
Segundo Sergio, a decisão do Greenpeace e das outras ONGs de deixar a convenção foi uma maneira de dizer que alguns países precisam se envergonhar, pois agem com descompromisso.
"Nem a tragédia nas Filipinas os comoveu. Se querem ficar fingindo, que fiquem fingindo sozinhos. Decidimos não ficar ali acompanhando esse teatro."
Para ele, é preciso parar o que chama jogo de faz de conta. "Nem que seja para os países irresponsáveis dizerem à população que simplesmente não conseguem superar suas diferenças. A humanidade já fez isso outras vezes, já optou por bater a cara na parede."
E, diferentemente de Klink, o diretor do Greenpeace encara as próximas negociações como um grande copo vazio. "Agora, temos o risco de chegar a 2015 adiando ainda mais o processo (contra o aquecimento global) e, claro, enfrentando as graves consequências que isso traz para todo mundo."