Aeroporto em obras, o péssimo estado das ruas e avenidas de Cuiabá e Várzea Grande e as críticas dos próprios moradores quanto ao caos em que a cidade se encontra devido às intervenções para a realização da Copa do Mundo de 2014 foram tema de uma matéria no site português Público”.
O texto, assinado pela jornalista Alessandra Prado Coelho e com fotos de Nelson Garrido, não poupa críticas à Capital mato-grossense, na reportagem intitulada “Com tanta obra ficamos todos estressados”.
A jornalista relata os desafios enfrentados pela reportagem para transitar pela cidade e o "estresse" que as obras têm causado à população, principalmente aos motoristas.
“Acabávamos de atravessar uma hora de trânsito exasperante, com estradas cortadas, desvios, terra, lama, e condutores à beira de um ataque de nervos (...) Nós fomos vítimas do caos que estas obras estão a provocar na cidade”, diz trecho do texto.
A reportagem relata a situação vivenciada por um motorista que precisava arcar com os danos causados em um automóvel alugado, após dirigir 1.700 km por estradas de má qualidade e finaliza:
“Aqui paga-se o terceiro mundo e depois paga-se o primeiro”.
Clique AQUI ou leia a seguir a íntegra do texto:
Com tanta obra ficamos todos “estressados”
Estamos numa Rent-a-Car junto ao aeroporto de Cuiabá. À nossa volta, obras e mais obras. Acabámos de atravessar uma hora de trânsito exasperante, com estradas cortadas, desvios, terra, lama, e condutores à beira de um ataque de nervos. Pagamos uma hora extra de aluguel pelo atraso com que entregamos o carro.
No Diário de Cuiabá lemos entretanto que o ministro da Aviação Civil, Moreira Franco, vistoriou os trabalhos do Aeroporto Marechal Rondon “e não ficou nada satisfeito com o que viu”, exigindo que o novo terminal fique concluído até ao final de Março. Neste momento, segundo o jornal, apenas 40% da obra foi feita. E a Copa vem aí.
Nós fomos vítimas do caos que estas obras estão a provocar na cidade. Mas só podemos relativizar a nossa situação quando ouvimos outro cliente que acaba de entrar na rent-a-car. O homem, brasileiro, acaba de percorrer 1700 quilómetros a trabalho (desnecessários, porque afinal a empresa tinha-se enganado ao indicar-lhe o destino, e ele podia ter voado para outra cidade). Está para lá de “estressado”, como ele próprio diz.
E mais “estressado” fica quando percebe que tem que pagar um arranhão no fundo do carro e ainda mais 100 reais (perto de 30 euros) pela “higienização” – um custo que é adicionado a quem fuma dentro do veículo.
O homem desabafa, vocifera contra o dinheiro que está a ser gasto em estádios e o que não está a ser gasto nas escolas e nos hospitais. Diz que dantes ainda podia ir ao Maracanã ver um jogo mas que agora os bilhetes estão tão caros que é impossível ir, revolta-se contra as prioridades do país – num discurso que é comum neste momento entre muitos brasileiros.
E indigna-se sobretudo – como tantos outros – com a dupla face do Brasil, de primeiro mundo para umas coisas e de terceiro mundo para outras. Um país em que, revela o número especial da revista Exame sobre as perspectivas para o futuro, o Produto Interno Bruto per capita é equivalente ao da Alemanha no Distrito Federal e ao da Mongólia no estado do Piauí, com todas as variantes pelo meio (o estado do Sergipe está ao nível da Namíbia, o do Rio de Janeiro ao da Argentina, por exemplo).
Um país em que um homem paga mais porque arranhou o carro ao andar 1700 quilómetros em estradas muitas vezes esburacadas e sem condições, mas em que um veículo tem que ser “higienizado” porque esse mesmo homem, “estressado”, fumou um cigarro lá dentro. Aqui paga-se o terceiro mundo e depois paga-se o primeiro.