“Eu não vi nem o acidente. Só escutei aquele estrondo. Não sei nem até agora quantas pessoas que morreram, por causa dessa desgraça”. Essa foi a reação do motorista Luiz Fernando Costa ao saber o número de mortos: ele chora.
O caminhão estava com a caçamba erguida e bateu na passarela, que caiu sobre as seis pistas da Linha Amarela, na manhã de terça-feira, no Rio. Dois carros foram esmagados. Três pessoas ficaram presas às ferragens. Das cinco vítimas que morreram, duas atravessavam a passarela.
O Fantástico teve acesso a essa imagem inédita. A câmera de segurança deste ônibus - que estava a poucos metros do caminhão - registrou o momento do acidente.
O motorista do ônibus contou à polícia que tentou avisar o caminhoneiro. Não conseguiu porque o veículo seguia em alta velocidade.
“Quando bati, veio um motorista, acho que empresa de ônibus. Ele falou comigo: "Olha lá o que você fez. Olha o que você fez." Eu falei: "Cara, o que que eu fiz?" Até então, eu não sabia. Pra mim tinha sido uma pancada na minha traseira com um doido, um outro caminhão, alguma outra coisa, Eu não sabia nunca que a caçamba estava levantada. Nunca. Nunca queria destruir, queria destruir uma família. Nunca”, conta motorista.
Mesmo sentindo muitas dores, Luiz Fernando aceitou falar com exclusividade ao Fantástico. Ele teve lesão no fígado, no coração e no pulmão. Quebrou três costelas.
“Não conseguia. Não saí nem de dentro da cabine de tanta dor. Que eu não sabia que estava com costela quebrada, não sabia que estava com nada. Só estava com muita dor. Agachado ali do lado do volante”, conta o motorista.
Ao dirigir pela Linha Amarela - que liga as zonas norte e oeste do Rio - Luiz Fernando cometeu várias irregularidades. Naquele horário, nove da manhã, caminhões são proibidos de circular pela via expressa. Ele estava acima da velocidade permitida. Não usava o cinto de segurança. E falava ao celular.
Fantástico - E a sua negligência você vai assumir?
Motorista - Com certeza. Não sou louco de levantar um troço de toneladas contra carros pequenos numa via daquela capaz de derrubar uma passarela.
O Fantástico levou um caminhão do mesmo modelo usado por Luiz Fernando para uma pista fechada para obras em São Paulo. Por motivos de segurança, o veículo não passou dos 40 km/h - velocidade bem inferior à do caminhão no momento do acidente.
“A caçamba normalmente pra acionar você pisa na embreagem até o final e aciona a tomada de força que manda pressão pra bomba hidráulica. Em seguida você libera o óleo da bomba hidráulica pra levantar a caçamba. O painel ele não indica nada o procedimento é todo hidráulico, não tem nem uma luz de advertência”, explica Alessandro Pereira Batista, motorista.
“O motorista vai perceber. Isso começa a balançar, tira todo o prumo do caminhão, o ponto de equilíbrio dele sobe. Desculpe mas tem que ser um motorista muito distraído pra durante três quilômetros não ter olhado no espelho”, afirma Mario Rinaldi. Dir Assoc. Fabricantes de Caminhões.
“Tu não sente impacto nenhum levantando uma caçamba daquela a não ser que tenha um tufão, furacão. Pra ficar aquela caçamba levantada. Aí eu vou sentir. Fora isso, levantar ela mesma coisa que quando tá parado. Eu senti impacto mas não sabia que era naquela passarela...”, afirma o motorista.
A Polícia civil pretende concluir as investigações do caso nesta semana.
“Pela investigação, ainda não temos a conclusão do laudo, mas que possa ter havido realmente uma falha humana, pela distração do motorista, principalmente por ter falado ao telefone celular. Ele pode ter acionado esse interruptor de força de forma voluntária ou involuntária por um esbarrão, por exemplo”, diz Fabio Asty, delegado.
“Eu não sei o que houve não. Mas houve falha mecânica. Se for feita a perícia... Embaixo do caminhão. Eles vão saber o que foi... Foi alguma coisa debaixo”, diz o motorista.
Luiz Fernando deve ser indiciado por homicídio culposo, sem intenção de matar. “Mas ao final da investigação ele pode até responder por homicídio doloso e lesões corporais dolosas. Caso tenha sido comprovado que ele assumiu o risco desse resultado que aconteceu”, diz Fabio Asty, delegado.
A empresa Arco da Aliança, dona do caminhão, aguarda o resultado da perícia. “Vida não tem como voltar. É uma coisa que infelizmente... Se não a gente voltaria o tempo, né. Mas as coisas que forem - que a Justiça falar que tem que fazer - a empresa com certeza vai assumir todas as responsabilidades”, declara Adélia Almeida Hernandes, dona da empresa.
Acidentes como o do Rio são mais frequentes do que se imagina
Estamos em Uberlândia, a maior cidade do Triângulo Mineiro. Em maio do ano passado, o acidente foi na BR-050, uma rodovia importante do país. O caminhão, que também estava com a caçamba levantada, bateu numa passarela de pedestre. No ponto, onde há muito mato, existia uma das rampas de aceso.
As imagens gravadas logo após a batida mostram a caçamba presa nas ferragens. Uma mulher que estava numa moto ficou ferida. E um homem, que atravessava a passarela numa bicicleta, morreu. Luis Amado Bezerra, de 58 anos, despencou de uma altura de mais de cinco metros.
A Polícia civil só encerrou as investigações na última sexta-feira. Segundo o delegado, o laudo da perícia foi inconclusivo. Mas o motorista José Eustáquio Alves foi indiciado por homicídio culposo.
Desde 2012, a Associação Brasileira de Normas Técnicas recomenda que os caminhões saiam de fábrica com um dispositivo de segurança, que evita que a caçamba levante em movimento.
“O próprio sistema a dez quilômetros por hora ele vai desligar a tomada de força”, explica Cristiano Bezerra, motorista.
“Perdão a todos. Se pudesse pedir... Eu tenho família também. Tenho um casal de filho. Cinco famílias destruída. A minha poderia ser a outra. Perdão mesmo.