Massacre do Carandiru
(Foto: Reprodução Globo News)
Acusados pelo Ministério Público por dez mortes e três tentativas de homicídio no quinto andar da Casa de Detenção, policiais militares do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) negaram em depoimento nesta segunda-feira (17), que tenham agido no último andar.
Este é o primeiro dia da quarta etapa do julgamento de policiais militares envolvidos no massacre do Carandiru. O julgamento começou por volta das 10h30 e terminou às 20h. O segundo dia será retomado nesta terça-feira (18), às 10h30.
Nesta fase, 10 policiais do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) são julgados por dez mortes mais três tentativas de homicídio no quinto andar. A princípio eram 12 réus, mas dois deles morreram antes do julgamento.
Das 12 testemunhas chamadas, apenas quatro apareceram e uma delas foi dispensada. Só um depoimento de acusação foi ouvido. Os réus alegaram que a ação do grupo se restringiu ao terceiro andar, quarto pavimento. O então capitão do Gate, hoje coronel da reserva, Wanderley Mascarenhas de Souza, afirmou que é inocente.
"Não atuamos no andar onde está sendo feita essa acusação. Tenho certeza de que atuamos no terceiro andar, quarto pavimento. Minha tropa não atuou nesse pavimento. Sou inocente", afirmou. "Perante Deus, estou tranquilo. Tenho convicção de que agi com profissionalismo", disse.
O major Marcelo de Oliveira Cardoso também afirmou ao juiz que ele e sua equipe atuaram no terceiro andar, quarto pavimento da Casa de Detenção, seguindo o que foi dito pouco antes pelo coronel.
Os policiais disseram ao juiz que a tropa foi acionada para desarmar eventuais bombas em barricadas deixadas pelos presos. Eles afirmaram ter dado tiros de advertência para o alto após entrar no pavimento e alegaram que foram acompanhados por outras tropas após deixar o pavimento.
Os réus foram orientados pelo advogado de defesa, Celso Machado Vendramini, a não responder perguntas do Ministério Público. Autorizados pelo juiz a deixar questões consignadas, os promotores questionaram os réus sobre disparos de metralhadora HK e sobre tiros disparados no quinto andar.
Testemunha da defesa, o corregedor dos presídios estaduais na época do massacre do Carandiru, Fernando Torres, admitiu aos promotores que houve "inegável excesso" da polícia.
O perito Osvaldo Negrini reiterou a afirmação de que tem "absoluta convicção" de que os tiros disparados dentro do Carandiru foram de metralhadora. Ele também afirmou que entre as armas apreendidas com os presos estavam em condições precárias, algumas com ferrugem e a maioria com numeração raspada. A PM não esclareceu em que celas as armas foram apreendidas.
Outras duas etapas do julgamento do massacre do Carandiru já foram realizados, com condenação de parte dos réus. No primeiro, em 21 abril do ano passado, 23 policiais militares foram condenados pela morte de 13 presos. A pena foi de 156 anos de prisão para cada um, mas eles recorrem em liberdade. Três dos 26 réus que eram julgados foram absolvidos. A sentença foi lida pelo juiz José Augusto Nardy Marzagão, que presidia o júri.
As absolvições foram pedidas pelo promotor Fernando Pereira da Silva, que também solicitou aos jurados que desconsiderassem duas das 15 vítimas inicialmente previstas no processo. Segundo ele, esses detentos foram mortos por golpes de arma branca, o que pode significar que foram assassinados pelos próprios presos. Por isso, os 23 PMs foram condenados por 13 mortes.
Julgamentos
A quarta etapa do julgamento ocorre antes da conclusão da terceira, que teve início no dia 18 de fevereiro, mas foi cancelada em seu segundo dia, após o advogado de defesa dos réus, Celso Vendramini, abandonar o plenário. A Justiça ainda ainda não remarcou a data.
No dia 3 de agosto do ano passado, outros 25 policiais e ex-policiais militares foram considerados culpados de homicídio qualificado e responsabilizados por 52 mortes, sendo sentenciados a 624 anos de reclusão em regime inicialmente fechado. A sentença foi lida pelo juiz Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo.
"Houve inequívoco abuso de poder", disse o juiz em sua sentença. Os réus, porém, puderam recorrer da sentença em liberdade. Os policiais também perderam o cargo público ainda em exercício, mas essa decisão só vai valer depois de julgados todos os recursos.
À época do massacre na Casa de Detenção, na Zona Norte da capital, os réus integravam as Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), tropa de elite da Polícia Militar. Lá dentro, eles teriam efetuado mais de 300 disparos no segundo andar, terceiro pavimento, do Pavilhão 9.
O júri havia sido determinado com 29 réus. Dois deles, no entanto, morreram, um passou por avaliação de sanidade mental e outro respondeu a processo separadamente. Os policiais respondiam inicialmente por 73 mortes. Durante o julgamento, porém, o promotor Fernando Pereira pediu que os réus respondessem por 52 mortes.
Massacre
Os julgamentos do massacre no Carandiru ocorrem mais de 20 anos após a invasão na Casa de Detenção, na Zona Norte de São Paulo. A ação terminou com a morte de 111 presos após a Polícia Militar entrar no Pavilhão 9 para controlar uma rebelião.
Antes destes júris, desde 2 de outubro de 1992, somente um acusado havia sido julgado: o coronel Ubiratan Guimarães. Ele foi condenado em 2001 a 632 anos de prisão, em júri popular, por ter dirigido a operação. Em 2006, o júri foi anulado pelos desembargadores do TJ. Meses depois da absolvição, Ubiratan foi morto a tiros no apartamento onde morava, nos Jardins. O processo do Carandiru tem ao todo 57 volumes, 111 apensos e 50 mil páginas.